sábado, 15 de fevereiro de 2014

O Realismo







O Realismo

Em 1857, era lançado no Brasil, o romance: o “Guarani” de José de Alencar. No mesmo ano, na França, Gustave Flaubert publicava “Madame Bovary” dando início ao movimento chamado realismo.
O Realismo foi um movimento literário que surgiu na segunda metade do século XIX, contrapondo-se ao Romantismo, impulsionado pelas significativas mudanças sócio-politico-científicas da época. Segundo Eça de Queiroz, o Realismo é: "uma base filosófica para todas as concepções de espírito - uma lei, uma carta de guia, um roteiro do pensamento humano, na eterna região do belo, do bom e do justo, (...) é a crítica do Homem, (...) para condenar o que houver de mau na nossa sociedade. (...) É não simplesmente o expor (o real) minudente, trivial, fotográfico, (...) mas sim partir dele para a análise do Homem e sociedade.”.


Momento Histórico

Para compreendermos o que foi o Realismo, primeiro, precisaremos analisar o contexto histórico em que foi concebido o movimento. Após o fracasso da Revolução francesa, a revolução industrial (iniciada no séc. XVIII) estava a “todo vapor” numa fase caracterizada pelo uso do petróleo e eletricidade; enquanto isso, simultaneamente, a ciência conseguia enorme proliferação nos avanços científicos, nos campos da física e química. Neste momento surgem fábricas gigantescas (complexos industriais), que alicerçam a vereda do capitalismo moderno; em contrapartida, devido ao êxodo rural, a população se aglutina nos centros urbanos, vivendo de maneira marginalizada, trabalhando nas fábricas emergentes  em condições sub-humanas.
Nesta fase conturbada, de entusiastas tecnológicos, surgem teorias de várias posturas subversivo-ideológicas que procuravam explicar a realidade, cada qual ao seu modo. Como é o caso do positivismo (August Comte), o Socialismo (Karl Marx e Friedrich Engels), Determinismo ( Hippolyte Taine) e o Evolucionismo (Charles Darwin) que são as bases para o pensamento da época. “Contudo, o pensamento filosófico que exerce mais influência no surgimento do Realismo é o Positivismo, o qual analisa a realidade através das observações e das constatações racionais” (VILARINHO).
Na segunda metade do séc. XIX também houve mudanças radicais em território brasileiro, pois a monarquia passava por sua primeira crise; seguida da guerra do Paraguai; a  instituição do partido republicano; e a abolição da escravatura.
Com a proclamação da abolição, o trabalho passou de mão-de-obra escrava para mão-de-obra assalariada, o que ficou marcado pela chegada de imigrantes europeus ( além de ser uma alternativa para branquealização do Brasil), para trabalharem nas lavouras do país. Estava evidente que a visão colonial ligada à monarquia estava ultrapassada e no de 1889, ocorreu um golpe de estado, protagonizado por republicanos e positivistas, que instituíram a Republica Federativa brasileira.



"O Pensador" de Rodin, um dos maiores expoentes do realismo na arte

Características

Com o momento histórico descrito acima, nasceu a necessidade de uma nova literatura, diferente do Romantismo, que era uma arte subjetiva (idealista), feita pela burguesia para burguesia. Assim, o Realismo é uma crítica direta ao Romantismo, e tendo como base o positivismo, o determinismo e o socialismo e todas suas variantes, torna-se focado no objetivismo, que surge como negação a subjetividade romântica, e mostra o homem diante e fora dele, não o “eu”, o personalismo cede terreno para o universalismo. O materialismo leva à negação do sentimentalismo e a metafísica.O nacionalismo e o passado histórico é deixado de lado, dando-se ênfase ao presente (contemporâneo).  E, sob influência de  Hippolyte Taine e sua Filosofia da arte, os autores realistas são adeptos do determinismo, segundo o qual a obra de arte seria determinada por três fatores: o meio, o momento e a raça. Os autores deste período são antimonárquicos, deixando evidente sua postura republicana e ainda apresentam uma visão anticlerical, com representações de padres corruptos e beatas degeneradas. Como opositor do romantismo, o realismo também contesta a idealização da mulher como objeto inatingível e logo se insere o triangulo amoroso. Na concepção de Castro os realistas: Negam a burguesia a partir da célula-mãe da sociedade: a família; eis porque os sempre presentes triângulos amorosos, formados pelo pai traído, a mãe adúltera e o amante, que é sempre um “amigo da casa”; para citarmos apenas exemplos famosos de Machado de Assis, eis alguns triângulos: Bentinho/Capitu/Escobar; L. Neves/Virgília/Brás Cubas; Cristiano Palha/Sofia Palha/Rubião.
Vale ressaltar que o Realismo é uma tendência genérica da escola literária e nela encontramos três tendências distintas: o Realismo, Naturalismo e o Parnasianismo. Sendo o Realismo e o Naturalismo na prosa e o Parnasianismo na poesia. Segundo Alfredo Bosi: "O Realismo se tingirá de naturalismo no romance e no conto, sempre que fizer personagens e enredos submeterem-se ao destino cego das "leis naturais" que a ciência da época julgava ter codificado; ou se dirá parnasiano, na poesia, à medida que se esgotar no lavor do verso tecnicamente perfeito".

O Realismo em Portugal

O Realismo em Portugal teve seu início em 1865, uma época em que liberais e representantes da velha monarquia deposta em 1820 travavam várias lutas. Foi um movimento de renovação, uma tentativa de levar Portugal à modernidade, trazendo ao país as ideias filosóficas e científicas que estava em alta na Europa na época.

Questão Coimbrã

Seu marco inicial foi marco a Questão Coimbrã, uma polêmica literária travada em jornais que teve início quando a Geração de 70, um grupo de intelectuais composto por Oliveira Martins, Teófilo Braga, Antero de Quental, entre outros, defensores das novas ideias da época, recebeu uma crítica do árcade Castilho, um importante representante do tradicionalismo.

Após esta crítica, Antero de Quental respondeu em carta aberta com outra crítica, desta vez à censura da livre expressão e do apadrinhamento que Castilho fazia com seus seguidores. Entre 1865 e 1866, então, surgiram diversas publicações de grupos que promoviam ataques, uns defendendo as ideias tradicionais e românticas, outros as realistas e modernas. Era o progresso contra o conservadorismo, o antigo contra o moderno.

Depois dessa primeira polêmica, este grupo de intelectuais começou a organizar conferências em 1870, promovendo debates sobre a renovação cultural e popularizando os ideais de modernização que estavam em alta na Europa e na Ámerica do Norte na época. Estas conferências ficaram conhecidas como Conferências Democráticas do Cassino Lisboense e deu mais força ao movimento realista português. Elas foram censuradas pelo governo português, no entanto, já nesta época, o Realismo era forte e deu origem a várias produções em poesia e prosa.

Realismo no Brasil

No Brasil o Realismo iniciou-se em 1881, com a publicação do romance: “Memórias póstumas de Brás Cubas” de Machado de Assis.
 Foi com este romance que foram inauguradas características marcantes no estilo Realista no Brasil, como a análise psicológica das personagens, o humor, monólogos interiores e cortes na narrativa (uma das principais características de Machado de Assis).
No romance realista (por se tratar de uma fase amena do período literário, ainda com fortes laços com o passado, só alcançando seu auge com o determinismo naturalista) a sociedade é vista pela ótica elitista, ou seja, com personagens que conviviam na alta roda da sociedade, Sendo delineadas em suas narrativas análises de comportamento, descrições minuciosas de lugares e objetos, concebendo uma representação fiel à sociedade da época.
O principal autor do Realismo no Brasil é Machado de Assis, que conseguiu com maestria em seus romances – Brás Cubas; Quincas Borba; D. Casmurro; Esaú e Jacó; Aires – elaborar progressivamente uma análise de comportamento do ser humano, pintando personagens indeléveis e fazendo uma representação fiel de uma sociedade decadente/emergente, ou seja, um documento da época. Veja o exemplo abaixo:

Naquele tempo contava apenas uns quinze ou dezesseis anos; era talvez a mais atrevida criatura da nossa raça, e, com certeza, a mais voluntariosa.  Não digo que já lhe coubesse a primazia da beleza, entre as mocinhas do tempo, porque isto não é romance, em que o autor sobredoura a realidade e fecha os olhos às sardas e espinhas; mas também não digo que lhe maculasse o rosto nenhuma sarda ou espinha, não.  Era bonita, fresca, saía das mãos da natureza, cheia daquele feitiço, precário e eterno, que o indivíduo passa a outro indivíduo, para os fins secretos da criação.  Era isto Virgília, e era clara, muito clara, faceira, ignorante, pueril, cheia de uns ímpetos misteriosos; muita preguiça e alguma devoção, - devoção, ou talvez medo; creio que medo.  (ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo, Scipione, 1994. p. 45)

Podemos notar todo o estilo irônico do autor, aqui com suas baterias voltadas contra as idealizações românticas que haviam moldado o gosto do público leitor. Repare que Machado parte de uma adjetivação que nos leva a montar um perfil da heroína romântica (a mais atrevida, a mais voluntariosa, bonita, fresca, carregada de feitiço, faceira) para só num segundo momento provocar a ruptura: ignorante, pueril e preguiçosa (CASTRO).
Se no período literário conhecido como romantismo havia a necessidade de uma literatura nacional, é no realismo que ela toma forma e se consolida, aliada às mudanças, ideologias e pensamentos contempladas por uma ótica objetiva.

Referências:

ASSIS, Machado de. Memórias póstumas de Brás Cubas. São Paulo: Scipione, 1994.
BOSI, Alfredo. História concisa da literatura brasileira. São Paulo: Cultrix, 1994.
CANDIDO, Antônio. Iniciação à literatura brasileira. São Paulo: Ouro Sobre Azul, 2010.
MAZZAROTTO, Luiz Fernando- Redação, gramática e literatura -2ed. - São Paulo: DCL, 2010.
CASTRO, André F. de. Realismo e Naturalismo. 2012. Disponível: http://www.coladaweb.com/literatura/realismo-e-naturalismo > acesso em 03 de nov. 2013
VILARINHO, Sabrina. Realismo. Disponível em: http://www.brasilescola.com/literatura/realismo.htm > Disponível em 03 de nov. 2013

Nenhum comentário:

Postar um comentário