segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Temor da Felicidade


    
     Enfim a primavera tinha chegado, na tribo todos estavam felizes, inclusive as moças que se preparavam para o ritual de núpcias. Entre elas havia uma índia estrábica, magra, sem curvas, e de longos cabelos negros, seu nome era Airumã. Ela era amiga da índia mais formosa da tribo, a bela Iaciara.

    Iaciara estava toda empolgada e esperava que o jovem caçador Apoema, que era o mais belo dos guerreiros lhe entregasse a oferenda de casamento. A oferenda de casamento consistia em o jovem guerreiro caçar o coração de uma ariranha e ofertá-lo a uma jovem donzela. Depois de aceito a oferenda, a virgem deveria conduzir o jovem guerreiro à sua tenda, onde ocorreria a união carnal.

    A única que não ligava com o ritual era Airumã, ela não era atraente como sua amiga e nunca percebeu nenhum jovem cobiçando seu corpo. Na verdade, odiava os costumes tribais, se pudesse deixaria a tribo e sabia que ninguém sentiria sua falta.

    Era uma manhã ensolarada, Airumã estava sob a sombra de uma mangueira, sua paz foi roubada quando percebeu uma movimentação na mata. Não sabia o que poderia surgir em sua frente, com medo, seu corpo estremeceu. Para seu alívio, percebeu que era Apoema que surgira entre a folhagem da mata. Ele aproximou-se da moça, ela percebeu que seu corpo atlético estava manchado de sangue, parando em sua frente, com voz trêmula ele disse: Airumã oferto-te meu coração.

    Ao direcionar os olhos para o jovem guerreiro, ela percebeu que ele estava com braço estendido e em sua mão segurava um órgão, um coração. O coração de Airumã encheu-se de alegria, não acreditava que o rapaz mais belo da tribo estava propondo matrimônio. Ela sempre nutriu uma paixão secreta por Apoema, afinal era o sonho de toda índia da tribo, casar-se com ele.

    Com lágrimas escorrendo pelo rosto, Airumã disse: Eu não aceito.

    O Guerreiro desconcertado, não acreditou nos seus ouvidos e perguntou:

    -Você não aceita, por quê?

    Com grande pesar ela respondeu:

    -Estou esperando outro guerreiro, mas Iaciara ficará feliz com sua oferta.

    Apoema baixou a cabeça e seguiu rumo à aldeia, inconformado e magoado por ter sido rejeitado. Airumã sentiu uma forte dor, era como se tivessem lhe roubado a alma, tinha jogado fora a chance de ser feliz. Ela amava o jovem, mas por ser estrábica, achava que não era boa o suficiente para ele. Ela temia a língua do povo, pois não era bela e por isso achava que ninguém poderia ter alguma atração por ela. Tinha se acostumado ao conformismo de seu complexo de inferioridade, por temer a felicidade de ser amada, pois isso destruiria seu limitado pensamento.

    Depois de alguns minutos de lamento, Airumã seguiu para aldeia. Ao chegar na entrada,  espantou-se ao ver Iaciara conduzindo Apoema até a sua tenda. Para o azar de Airumã a tenda ficava ao lado da sua. Ela podia ouvir os gemidos constantes de Iaciara, que parecia delirar de prazer. A pobre estrábica lamentava-se por ter sido covarde, se não tivesse tido medo, poderia estar agora se fartando de toda aquela lascívia.

    Foi durante a madrugada que ela resolveu partir, ao sair de sua tenda encontrou Apoema sentado, tomando um gole d'agua numa cuia. Ao perceber que Airumã o fitava, ele direcionou um olhar de desprezo à pobre índia e voltou a buscar as carícias da esposa. O pranto tomou conta de Airumã, desconsolada seguiu para o sul da floresta, não sabia para onde iria, mas em qualquer lugar que fosse, seria pouco para acalmar seu coração.

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