Enfim a primavera tinha chegado, na tribo todos
estavam felizes, inclusive as moças que se preparavam para o ritual de núpcias.
Entre elas havia uma índia estrábica, magra, sem curvas, e de longos cabelos
negros, seu nome era Airumã. Ela era amiga da índia mais formosa da tribo, a
bela Iaciara.
Iaciara estava toda empolgada e esperava que o jovem
caçador Apoema, que era o mais belo dos guerreiros lhe entregasse a oferenda de
casamento. A oferenda de casamento consistia em o jovem guerreiro caçar o coração
de uma ariranha e ofertá-lo a uma jovem donzela. Depois de aceito a oferenda, a
virgem deveria conduzir o jovem guerreiro à sua tenda, onde ocorreria a união
carnal.
A única que não ligava com o ritual era Airumã, ela
não era atraente como sua amiga e nunca percebeu nenhum jovem cobiçando seu
corpo. Na verdade, odiava os costumes tribais, se pudesse deixaria a tribo e
sabia que ninguém sentiria sua falta.
Era uma manhã ensolarada, Airumã estava sob a sombra
de uma mangueira, sua paz foi roubada quando percebeu uma movimentação na mata.
Não sabia o que poderia surgir em sua frente, com medo, seu corpo estremeceu. Para
seu alívio, percebeu que era Apoema que surgira entre a folhagem da mata. Ele
aproximou-se da moça, ela percebeu que seu corpo atlético estava manchado de sangue,
parando em sua frente, com voz trêmula ele disse: Airumã oferto-te meu coração.
Ao direcionar os olhos para o jovem guerreiro, ela
percebeu que ele estava com braço estendido e em sua mão segurava um órgão, um
coração. O coração de Airumã encheu-se de alegria, não acreditava que o rapaz
mais belo da tribo estava propondo matrimônio. Ela sempre nutriu uma paixão
secreta por Apoema, afinal era o sonho de toda índia da tribo, casar-se com
ele.
Com lágrimas escorrendo pelo rosto, Airumã disse: Eu
não aceito.
O Guerreiro desconcertado, não acreditou nos seus
ouvidos e perguntou:
-Você não aceita, por quê?
Com grande pesar ela respondeu:
-Estou esperando outro guerreiro, mas Iaciara ficará
feliz com sua oferta.
Apoema baixou a cabeça e seguiu rumo à aldeia, inconformado
e magoado por ter sido rejeitado. Airumã sentiu uma forte dor, era como se
tivessem lhe roubado a alma, tinha jogado fora a chance de ser feliz. Ela amava
o jovem, mas por ser estrábica, achava que não era boa o suficiente para ele.
Ela temia a língua do povo, pois não era bela e por isso achava que ninguém
poderia ter alguma atração por ela. Tinha se acostumado ao conformismo de seu
complexo de inferioridade, por temer a felicidade de ser amada, pois isso
destruiria seu limitado pensamento.
Depois de alguns minutos de lamento, Airumã seguiu
para aldeia. Ao chegar na entrada, espantou-se
ao ver Iaciara conduzindo Apoema até a sua tenda. Para o azar de Airumã a tenda
ficava ao lado da sua. Ela podia ouvir os gemidos constantes de Iaciara, que
parecia delirar de prazer. A pobre estrábica lamentava-se por ter sido covarde,
se não tivesse tido medo, poderia estar agora se fartando de toda aquela
lascívia.
Foi durante a madrugada que ela resolveu partir, ao
sair de sua tenda encontrou Apoema sentado, tomando um gole d'agua numa cuia. Ao
perceber que Airumã o fitava, ele direcionou um olhar de desprezo à pobre índia
e voltou a buscar as carícias da esposa. O pranto tomou conta de Airumã, desconsolada
seguiu para o sul da floresta, não sabia para onde iria, mas em qualquer lugar
que fosse, seria pouco para acalmar seu coração.
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